O Sabonete Pom Pom
O único aniversário que tenho lembrança da minha infância, foi quando fiz 6 anos. Com certeza comemoramos outros, mas nesse ganhei uma festa e um presente que jamais esqueci. Dias antes, a Zélia, uma parente nossa que morava ali por perto, conversava com minha mãe na cozinha. Entre goles de café e biscoitos casadinhos, elas tramaram a festa. Minha mãe faria os pastéis e as coxinhas. A Zélia faria o bolo. Na semana seguinte, a Zélia saia lá de casa com todos os ingredientes num saco. Latas de leite condensado, massa santista, açúcar refinado, compotas de ameixa e abacaxi. Vi quando ela subiu o atalho e atravessou a cerca que dava na linha do trem, com o imenso saco nas costas.
A semana passou lenta e eu imaginando a festa. Finalmente chegou o dia. Levantei cedo, varri o terreiro com vassouras de alecrim, que meu pai fazia com esmero. Tomei banho, e logo já era de tarde. Os convidados foram chegando, todos queriam me ver e entregar os presentes. Ganhei muitos presentes. No final da festa minha mãe e meus irmãos separavam e se admiravam com os regalos.
-Olha que lindo! Um carrinho. – Nossa, que roupa chique, última moda! – Uma caixa de bombom. Pode pegar um? – Um sapato de verniz, quem que deu? Isso é caro! Cada embrulho tinha seu peso, seu valor. Deixei todos se deliciarem com os presentes e me agarrei com o que mais gostei. Um sabonete Pom Pom. Não se tratava de um sabonete comum, não tinha o cheiro dos outros sabonetes. Era uma caixinha quadrada escrito Pom Pom em azul, com um sabonete branquinho e um perfume tão delicado que escondi na gaveta e no fundo da minha alma.
O aniversário passou e o sabonete permaneceu, perfumando, por longo tempo, as roupas surradas da minha infância. Quando mais tarde, resolvi usá-lo, usei com dor no coração. Estava amarelado, parecia uma pedra. Já não tinha cheiro nem espuma, tinha- se perdido no tempo. Nem me trouxe lembranças dos meus 6 anos, foi perdendo a memória enquanto eu crescia. Perdeu-se como a infância. Dissolveu seu aroma nos anos que se passaram até ficar completamente inodor. Perdeu-se ante aos acontecimentos daquela casa, daquele quarto, daquela gaveta. Perdeu tudo. Menos a poesia, que aquele dia despertou em mim.
Para os aniversariantes de junho. Inclusive eu. Feliz aniversário!
Por Lido Loschi, ator do Grupo Ponto de Partida.